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18 de abril de 2005

O desastre da Matemática

Com a devida vénia à Pública, edição de 17/04/2005, vou aqui reproduzir o texto de uma entrevista a Nuno Crato, presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática. É que isto é muito raro. Um presidente de uma associação de professores a falar sem medo de ir contra o "politicamente correcto", desassombradamente, é quase inédito. Ora leiam (os "azuis" são meus):

A Matemática não é só um problema em Portugal.
Não, mas em Portugal a situação é mais gra­ve do que a média na OCDE e mais grave do que na maioria dos países europeus. É um problema com 20 ou 30 anos e que vem persistindo, ao mesmo tempo que têm sido implementadas reformas sem sucesso. Falo do ensino da Matemática e do ensino em geral. Só que a Matemática funciona como um barómetro e como é mais mensurável o insucesso verifica-se mais nesta disciplina. Mas o problema do insucesso é generalizado às disciplinas básicas.
A quem atribuir a culpa?
Esta situação deve-se a uma conjugação de factores sociais e da escola. Mas a verdade é que estamos a falhar. Reconhecê-lo é um pri­meiro passo. E repare-se que a preocupação com o que se passa generalizou-se na socieda­de portuguesa, com uma excepção: os teóricos da pedagogia que se recusam a reconhecer os problemas existentes. Não conheço soluções milagrosas, nem me parece que se devam fazer grandes reformas. Mas há algumas coisas que se podem fazer, se devem fazer e não se fazem. Talvez se deva começar por aí.
Por onde?
Melhorar a formação dos professores e submeter a sua entrada na carreira a critérios mais objectivos. Actualmente o único critério para se entrar na carreira é a nota final da li­cenciatura. Ora, isto tem um efeito perverso, que é incentivar os alunos a deslocar-se para escolas mais facilitistas e convida estas últimas a inflacionar as notas. Solução? Podia-se exigir um exame de en­trada na profissão, implementar um factor de avaliação externo.
Outro exemplo de medidas que se podiam tomar e não tomam é a instituição de uma formação matemática mínima para os professo­res do ensino básico. Veja-se, por exemplo, que a formação dos professores que vão leccionar o primeiro ciclo é feita em escolas superiores de educação onde a formação em Matemática é muito variada. Repare-se que se pode entrar nestas escolas tendo deixado a Matemática no 9 ° ano e até tendo sempre chumbado a esta disciplina. Mas depois pode-se ensinar Matemática...
Outro exemplo de coisa a mudar é a in­definição de programas. Destruiu-se o cur­rículo do ensino básico em nome da teoria das competências, o que foi um dos piores erros da teoria pedagógica romântica. Subs­tituíram-se conhecimentos por ideias gerais. O documento das "Competências Essenciais" de 2001 pretende fazer isso: substituir progra­mas e conhecimentos determinados por um conjunto de competências abstractas e vagas. Os resultados estão à vista, reflectem a incons­ciência que foi adoptar este regime.
Uma questão concreta: é importante sa­ber a tabuada de cor?
Sim, embora não chegue. Mas o problema da pedagogia romântica é o de substituir uma coisa que não chega por nada. O eixo desta pedagogia baseia-se na existência de uma oposição entre compreensão e mecanização, esquecendo que, ao mecanizar, ao automatizar, liberta-se o cére­bro para o raciocínio. Nos programas de Mate­mática do 1º ciclo, que não foram abolidos, pois apenas se instituíram competências essenciais, diz-se, por exemplo, que o aluno pode usar a máquina de calcular sempre que queira. Não é isto um disparate completo?

É lá, que o homem não tem papas na língua. Será que vamos começar a pôr na ordem os tipos das "Ciências" da Educação?

1 comentário:

Anónimo disse...

"Será que vamos começar a pôr na ordem os tipos das "Ciências" da Educação?"

Era bem preciso...