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29 de outubro de 2004

Alô pais! Cuidado!

Conta-se aqui a história de uma creche que queria instalar algumas câmaras de vídeo nas suas salas e refeitório. As imagens das câmaras seriam acessíveis através da Internet mediante password do conhecimento dos pais das crianças. Todos estavam de acordo, mas, apesar disso, a direcção da escola entendeu pedir parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados. E, pasme-se, a resolução da CNPD, que faz jurisprudência, foi no sentido da ilegalidade da iniciativa. Assim, ficou determinado que o “sistema de câmaras atenta contra os direitos dos trabalhadores - que a lei proíbe que sejam vigiados - e das crianças”.
Desta forma, ficámos a saber duas coisas:

  • Que os trabalhadores não podem ser vigiados. Fantástico! Então a Lei proíbe que os trabalhadores sejam vigiados? Não conheço essa lei. Mas também não preciso de a conhecer. Vou já dizer à minha mulher que não pode vigiar a nossa empregada de limpeza (antigamente chamava-se “mulher-a-dias”). Não pode! É proibido! Quando algum serviço não for feito, ou for mal feito, o melhor é despedi-la logo antes que haja uma lei que proíba o despedimento de trabalhadores que não trabalhem.
  • Que os pais não podem vigiar os filhos. É que a “captação de imagens é um constrangimento injustificado do direito à intimidade das crianças e à sua privacidade”. Quer isto dizer que, no limite, um pai não pode filmar o(s) filho(s) a brincar com outra(s) criança(s)!

Não resisto a transcrever o último parágrafo:
A CNPD está ainda preocupada com o crescimento das crianças que estão sobre videovigilância. A partir do momento em que os meninos sabem que estão a ser vigiados, assumem-no como uma coisa natural. Tal como os pais se podem habituar a controlar os filhos. "No futuro, as crianças vão achar normal que os pais lhes mexam nas gavetas e vigiem todos os seus passos", interpreta Catarina de Albuquerque, especialista em Direitos Humanos, que concorda com a deliberação da CNPD.

As crianças poderão vir a considerar normal serem vigiadas! Credo!
Os pais poderão vir a habituar-se a controlar os filhos! Abrenúncio!

Será que anda tudo doido?

3 comentários:

BlueShell disse...

É tarde....
voltarei...

João Campos disse...

A medida é polémica, convenhamos. Percebo a utilidade (ou pseudo-utilidade) do sistema. E, pessoalmente, sinto-me inclinado a concordar com a resolução tomada. O mundo em que estamos não é como o que Orwell imaginou no "1984"; não cheguemos a extremos. O argumento do trabalhor não é a meu ver válido, uma vez que sob observação um qualquer trabalhador estaria sob aquilo que em Psicologia se chama de "efeitos de Hawtorne". O mesmo se passaria com as crianças, que decerto perderiam a sua espontaneidade natural sabendo que estavam a ser vigiadas. Não tenho filhos, como tal, não compreendo a preocupação dos pais (neste momento estou ainda "do outro lado da barricada"). Mas considero que vigiar os filhos na creche, na escola, mais do que um atentado à privacidade das crianças, é a maior prova de não-confiança que se pode dar. No entanto, e como disse no início, reconheço que a questão é polémica.

João Campos disse...

Agradeço, desde já, a visita ao meu blog (que ultimamente tem andado muito parado)!
Em relação à questão que coloca, a resposta é óbvia: e evidente que não creio que criança alguma venha a sofrer de qualquer tipo de disfunção por ser vigiada pelos pais aos cinco anos de idade, no infantário. Falo da minha experiência pessoal - mesmo aos cinco anos de idade, saber que me estavam a observar limitava-me muito os movomentos. Ainda hoje o facto de estar a alguém a observar-me quebra-me momentaneamente a capacidade criativa. A questão, a meu ver, passa por aí. E, também, como menconei, pelo ponto da confiança - não só nos filhos (se bem que principalmente), mas também nas próprias educadoras. Creio ser importante que desde cedo os pais demonstrem aos filhos que confiam neles, ainda que estes, por serem tão novos, não compreendam isso - mas acredite: um dia mais tarde hão-de compreender, e hão-de dar muito valor a isso - há coisas que não nos marcam no presente em que ocorrem, mas no futuro, no despertar da consciência. No entanto, aceito a argumentação oposta, até porque compreendo o que está aqui em causa. Mas sou desconfiado por natureza - e pergunto-me quão longe iria a questão do controlo ao se começar por algo tão simples como tomar conta das crianças.